
09/05/2025 - 17h34
Ser mãe ainda é um obstáculo no mercado de trabalho
Para especialista, viés da maternidade ainda pesa em processos de Recursos Humanos
Apesar dos avanços nas pautas de diversidade e inclusão, a maternidade continua sendo um divisor de águas na trajetória profissional de muitas mulheres. Segundo a pesquisa Esgotadas, da Think Olga, mulheres dedicam, em média, 21,4 horas semanais ao trabalho de cuidado não remunerado, quase o dobro do tempo dedicado por homens (11 horas). Em um ano, são mais de 1.100 horas a mais — o equivalente a 24 dias inteiros de diferença.
O desequilíbrio afeta diretamente a permanência, o desempenho e o bem-estar de mulheres no mercado de trabalho, sobretudo mães e cuidadoras, que também apresentaram os maiores índices de insatisfação com saúde emocional, situação financeira e carga de responsabilidades
Para Laura Salles, CEO da startup PlurieBR, especializada em gestão de dados em tempo real de diversidade, equidade, inclusão e pertencimento, essa exclusão não é acidental. “O viés da maternidade ainda pesa nos processos de contratação, promoção e até avaliação de desempenho. Muitas empresas falam de inclusão, mas ainda operam sob uma lógica que penaliza a experiência da maternidade”, afirma.
Complementando, Ana Conti, conselheira e consultora da PlurieBR e mãe de três filhos, diz que a maternidade não enfraquece a performance, o que pesa é o julgamento enviesado. “Sempre observei que mulheres voltam da licença-maternidade com ainda mais foco, disciplina e potência. O problema nunca foi a performance, é o olhar viciado de quem prefere reforçar estereótipos a enxergar o valor real que elas entregam.”
ESTIGMA SILENCIOSO E PERDA DE TALENTOS
Estudos e relatos de profissionais demonstram que mães continuam sendo alvo de suposições sobre produtividade, disponibilidade e comprometimento. O impacto disso vai além das barreiras de entrada: afeta também a permanência, o desenvolvimento e o acesso a cargos de liderança. Laura diz que mulheres estudam mais, entregam melhores resultados e ainda assim seguem como minoria nas lideranças, o que tem tudo a ver com a forma como a maternidade é tratada.
“Há uma desconexão entre o discurso e a prática. E quando isso acontece, a cultura organizacional se torna excludente por padrão”, analisa.
A exclusão de mulheres mães não é uma questão individual, é reflexo de modelos de gestão que ainda não foram redesenhados para realidades plurais. Para Laura, é preciso que empresas adotem práticas mensuráveis de apoio à maternidade, não apenas ações pontuais. Isso inclui desde o mapeamento do impacto da parentalidade nas taxas de turnover até a criação de trilhas de carreira flexíveis e redes de suporte entre colaboradoras. “É fundamental que o debate sobre parentalidade considere o papel da primeira e da segunda pessoa cuidadora, com políticas flexíveis de licença que respeitem a estrutura de cada família.”
Esse é o melhor caminho para combater os estigmas que ainda recaem sobre a maternidade. Se o pai tem cinco dias de licença e a mãe, quatro meses, fica explícito o desequilíbrio que se reflete em demissões no retorno, interrupções de carreira e desigualdades profundas no ambiente de trabalho.
Laura lembra ainda que políticas eficazes de apoio à parentalidade devem contemplar também o papel dos pais e responsáveis, promovendo corresponsabilidade e quebrando estigmas de gênero no cuidado. “Falar de maternidade é falar de pertencimento. E ambientes com senso real de pertencimento são mais resilientes, inovadores e produtivos. Incluir mães não é só uma pauta social, é uma decisão estratégica de negócio”, conclui.
Foto: Shutterstock