17/11/2023 - 12h12
Fim do ano, fim do mundo…
Uma reflexão do colunista Marcelo Madarász sobre as nossas escolhas e a finitude da vida
Por Marcelo Madarász*
Já estamos em novembro e ouvi algumas vezes que está se aproximando o final do ano, mas a sensação é de que se aproxima também o fim do mundo e, com isso, a sensação de incompetência, porque não conseguiremos cumprir todos os prazos, eliminar todas as pendência, zerarmos todas as to do lists.
Poderíamos trazer várias referências bibliográficas que demonstram explicações para o aumento absurdo de casos de transtornos mentais, aliados à depressão, estresse, burnout. Poderíamos também enveredar por uma outra trilha, na qual a explicação para nos afogarmos num oceano de obrigações e deveres passa pelo desejo narcísico de mostrar ao mundo o quanto somos ocupados e, portanto, importantes, como se uma coisa tivesse relação obrigatória com a outra.
Em nossa moral judaico-cristã, na qual aprendemos que o sofrimento ajuda a nos libertar, não é por acaso que a origem da palavra trabalho é do latim, tripalium ou tripalus, ferramenta de três pernas que imobilizava cavalos e gado para serem ferrados, assim como o nome de um instrumento de tortura usado contra escravos e presos, que, por sua vez, originou o verbo tripaliare, cujo primeiro significado era torturar.Com tudo que aprendemos sobre a força do propósito e de sua nobreza de intenções e conexões, será que para a grande maioria o trabalho ainda é sofrimento?
No meio dessa avalanche de informações, nos vemos atribulados, cansados, exaustos, sem agenda. Lembro-me de um professor absolutamente brilhante do MIT, Insead e outras instituições, chamado Joe Santos, que, ao ser apresentado a um alto executivo no Brasil, fez uso de seu tradicional estilo português e, ao ouvir que esse executivo gostaria de assistir sua aula, mas que não poderia, por não ter agenda, riu e comentou de forma ácida: acha que tem algum poder, mas não tem sequer poder sobre sua agenda. Então, se fez o silêncio e, daquele comentário gerador de desconforto, o executivo cancelou seus compromissos e assistiu à aula do brilhante professor e mestre.
Complicações de agendas e angústias, sazonais ou não, à parte, acredito que todas as situações precisem ser contextualizadas e, dessa forma, passa a fazer mais sentido a reflexão a seguir.
O que desenha nossa agenda e programação para as próximas semanas ou meses são as nossas prioridades. No dia 11 de novembro, Tânia Moura, profissional de RH muito reconhecida no mercado, promoveu um encontro cujo nome é Viver (In)Finitos e reuniu muitas pessoas de suas redes, família, amigos, pessoas do mundo do RH. Como ela mesma disse, foi um evento para a celebração da vida, um mergulho na fé, na graça e na espiritualidade, com o objetivo de também explorar o propósito que podemos encontrar mesmo diante dos desafios mais difíceis.
No caso da Tânia, o desafio veio na forma de uma doença rara, degenerativa, com expectativa de vida curta. Com todas as suas atuais dificuldades, o que marcou a todos foi o seu sorriso e na mensagem que pudemos ouvir, graças ao uso da tecnologia, ela expressa sua profunda gratidão a todos e à vida. Ela e sua família nos presentearam com um encontro mergulhado em muita emoção, despertando nas pessoas ali presentes ou conectadas virtualmente uma reflexão profunda sobre definição de prioridades.
Após acalmar o coração, a frase que me vinha é emprestada do rabino Nilton Bonder: haverá paz na consciência de nossa finitude? O que é o fim do ano, o que é o fim da vida? Existe fim? Será que, da mesma forma que, após a noite de 31 de dezembro, o sol volta no dia 1º de janeiro e, na verdade, nada acabou, assim é com a nossa vida?
Para alguns, falar de morte, além de inaceitável e de mau gosto é algo quase proibido. Para outros, os que têm a coragem, falar de morte é falar de vida, é falar de nossas escolhas, é refletir sobre o que se está construindo hoje e pensar em que legado deixamos. É necessária grande coragem para encarar este tema.
Tânia Moura é mulher de muita coragem! Nossa gratidão a ela e a todos que nos fazem refletir sobre nossas escolhas!
*Marcelo Madarász é diretor de RH para América Latina da Parker Hannifin
Foto: Marcos Suguio