28/06/2021 - 15h30
Você está demitido!
A prática de demissão remota é tema de artigo do vice-presidente da SAP Concur, Denis Tassitano
Por Denis Tassitano*
Sempre fui adepto do trabalho remoto. Mesmo antes da pandemia, eu acreditava e já tinha o histórico para comprovar que determinados tipos de trabalho poderiam, sim, ser desempenhados tão bem, ou até de forma melhor, de maneira remota. Mas penso também que algumas considerações importantes precisam ser feitas. Então, vamos lá.
Fiquei surpreso e ao mesmo tempo preocupado com uma enquete que promovi no meu perfil do LinkedIn, em que eu questionava se as pessoas acreditavam que o processo de demissão - que agora, obrigatoriamente, é conduzido de maneira remota por conta de procedimentos de segurança - deveria continuar dessa forma mesmo após o término do distanciamento social. Eu queria parametrizar a quantidade de pessoas que consideravam normal a demissão a distância e, para o meu espanto, a maioria acreditava que sim, ser despedido por videoconferência se tornou uma prática comum e não existe problema em continuar nesse modelo.
Alguns participantes desta enquete chegaram a comentar que haviam passado por essa experiência de demissão virtual, e que isso tinha sido muito cruel. Outros optaram por citar o filme Amor sem Escalas, em que o personagem de George Clooney tem como tarefa percorrer os Estados Unidos, acumulando horas de viagem e milhas em seu cartão de fidelidade, com a incumbência de despedir pessoas em processos de demissões em massa. Mas, durante a trama, uma nova integrante da empresa em que o personagem trabalhava sugeriu uma ideia, até então, inovadora: substituir as incansáveis viagens por um processo de demissão via videoconferência. O novo modelo desagradou totalmente ao protagonista do filme, que passava toda a trama tentando provar que o processo de demissão presencial, por mais "cruel" que fosse, era o meio mais humano na hora de desligar um colaborador, independentemente dos custos de transporte envolvidos.
O que muita gente não ponderou ao comparar a demissão remota do filme com as que presenciamos atualmente é que os demitidos do longa metragem estavam nos escritórios, enquanto na vida real as pessoas estão sendo desligadas em suas próprias casas. Ser demitido, independentemente de sua situação financeira ou perspectivas de encontrar uma realocação, sempre é um processo difícil, pois envolve fatores como a surpresa da notícia e o ego do demissionário. Agora, ser desligado estando em casa envolve diversos fatores que a empresa não pode ponderar e sequer controlar.
O desligamento dentro do escritório permite ao colaborador dispensado aquele tempo de processar a informação, conversar, ou não, com colegas do trabalho e utilizar o trajeto até sua casa para absorver a notícia. Já a demissão virtual inibe a possibilidade de assimilarmos "melhor" a má notícia. Por mais "acolhedor" que seja estar em sua residência e ter a presença de pessoas do seu convívio, escutar o anúncio do desligamento com os filhos ao lado estudando, por exemplo, é uma situação constrangedora e que está fora do domínio das empresas.
Inclusive, o próprio filme que menciono neste artigo tenta transmitir a sensação de que as reações humanas podem ser inúmeras, inesperadas e a ausência da presença física de uma das partes envolvidas no processo de demissão pode gerar uma situação ainda mais dolorosa.
Eu comecei o texto dizendo que sempre pratiquei e acreditei que é possível ter performance trabalhando remotamente, mas compreendo perfeitamente que nem todas as tarefas precisam ser realizadas nesse modelo. Por mais automatizado que esteja se tornando o trabalho, ele tem o aspecto humano e o presencial faz parte da história desde que trabalho é trabalho, está no nosso DNA. Não é mesmo?
*Denis Tassitano é vice-presidente da SAP Concur no Brasil
Foto: Divulgação/SAP Concur