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10/11/2025 - 12h17

Autovalorização: a nova base da performance sustentável nas organizações

Clarissa Medeiros fala do que sustenta a vitalidade humana ante as transformações exponenciais do trabalho

Por Clarissa Medeiros*

 

A atual geração de líderes foi preparada para um mundo que já não existe mais. Fomos educados para caber em modelos prontos, repetir padrões e perseguir um ideal de sucesso que se mede por crescimento financeiro e resultados imediatos.

 

Mas esse modelo de sucesso, que privilegiou a hiperatividade e a busca do comando e controle, está mostrando sinais de esgotamento. E, com ele, as lideranças se veem diante da incerteza: o desafio de não saber mais o que sustenta a vitalidade humana em meio à complexidade e à aceleração das transformações exponenciais do trabalho.

 

Isso traz imensos desafios de reinvenção e de adaptabilidade, uma imensa demanda por desenvolvimento humano e atualização constante  é o famoso upskilling e reskilling da liderança. E esses desafios, juntamente com a imensa sobrecarga diária, nos levam a um cenário de perseguição constante à performance a qualquer custo  o grande risco deste momento, em que as organizações passam a buscar mais eficiência e a fazer reestruturações constantes junto a times frequentemente desgastados.

 

A consequência é visível: índices crescentes de ansiedade, perda de engajamento e afastamentos por esgotamento profissional  sobretudo entre mulheres, que historicamente acumulam múltiplos papéis e sofrem de mais sobrecarga.

 

De onde vem a desconexão

Desde crianças, fomos educados para nos “encaixar” num modelo de sucesso pré-definido: estudar para conseguir um bom emprego, construir uma carreira linear.


Mas o mundo do trabalho passou a ser disruptivo e a maioria das lideranças, que cresceram sob o paradigma do controle e da competição, precisa agora aprender a navegar num ambiente de interdependência, colaboração e adaptabilidade.

 

Esse é o verdadeiro desafio do upskilling humano: desenvolver não apenas novas competências técnicas ou as chamadas soft skills, mas uma nova consciência de si e de suas capacidades humanas, pois a construção da resiliência necessária é um processo bastante pessoal e que ultrapassa o mundo do trabalho.

 

Autovalorização: o novo código da vitalidade humana

Nos programas de desenvolvimento que conduzo nas corporações, tenho percebido que a autovalorização é a chave que sustenta a performance sustentável.

 

Para quebrar o código de como se dá o efetivo desenvolvimento de competências humanas, organizei um modelo que chamei de Mandala da Autovalorização, com cinco dimensões que fortalecem o coeficiente de energia individual:

 

1- Autorrespeito reconhecer onde se está quanto à saúde mental e formular intenções de avanço, com honestidade e autocompreensão.

 

2- Autocompaixão cultivar uma relação mais gentil consigo, reduzindo a autocrítica e acolhendo a imperfeição como parte da condição humana  isso melhora a vitalidade.

 

3- Autocuidado praticar rituais de reposição de energia, como ficar em silêncio e permitir-se o descanso necessário que regenera corpo e mente.

 

4- Autoconhecimentoidentificar talentos, condicionamentos e zonas de fluxo, integrando propósito e resultado.

 

5- Autogestão aprender a navegar pelas emoções e a transformar medo, raiva e tristeza em bússolas para melhores decisões e aprendizado.

 

Esse é o novo alicerce da liderança consciente: elevar a vitalidade e o senso de presença por meio da autovalorização para sustentar clareza e confiança em contextos complexos.

 

O papel do RH: de gestor de processos a guardião da energia humana

A área de Recursos Humanos tem, hoje, um papel vital nesse processo. Mais do que implementar políticas, o RH tem o desafio de ser curador de programas e práticas que contribuam para devolver humanidade às relações corporativas — influenciando na criação de ambientes onde o colaborador é visto não só como recurso, mas como um ser integral em desenvolvimento. Algumas boas práticas incluem:

 

► Programas de mentoria para lideranças conscientes, que conectam performance e propósito.

 

► Espaços seguros de diálogo, onde o erro possa ser visto como parte do aprendizado e não como falha pessoal.

 

► Programas de bem-estar e performance sustentável, que unem gestão da saúde mental e relações humanizadas à gestão de pessoas e resultados.

 

►Lideranças inspiradoras de dentro para fora, mais preparadas para incentivar pertencimento, autonomia e senso de valor nos times.

 

Na medida em que o RH se posiciona como agente dessa transformação cultural – o que envolve o upskilling dos próprios profissionais de RH –, as empresas poderão experimentar um novo tipo de resultado: aquele que nasce do alinhamento entre valor humano e valor organizacional.

 

A Seguros Unimed traz um caso inspirador de como o RH pode impulsionar essa transformação. Nos últimos três anos, tenho contribuído na implantação de programas de Desenvolvimento de Lideranças que começaram com formação de mentores de mulheres - iniciativa que rompeu silos e construiu um novo patamar de diálogo na empresa, além da progressão de carreira de talentos mapeados.

 

Essa frente de desenvolvimento, que avançou para o programa que chamei de Performance Sustentável, integra saúde mental, autovalorização e relações humanizadas como eixos estruturantes da cultura corporativa.

 

O programa tem como propósito fortalecer o autoconhecimento dos líderes, o protagonismo e criar uma liderança mais consciente e conectada com o propósito institucional.

 

E o projeto vem gerando resultados tangíveis: líderes mais engajados, ambientes de maior confiança e times com maior senso de pertencimento e vitalidade.

 

Agora, essa iniciativa entra em uma nova fase de expansão, ampliando seu alcance para novas áreas e camadas da organização, reforçando o compromisso com a gestão humanizada, o bem-estar e a sustentabilidade da performance no longo prazo.

 

Para onde estamos indo

Estamos atravessando uma transição profunda e com múltiplas dimensões simultâneas — e que envolve sair do fazer automático para o agir com mais consciência. Por isso, afirmo que autovalorização não é autoindulgência: é a base da performance sustentável, porque resgata a energia vital e o propósito que move toda realização genuína, e é essa consciência que vem orientando as organizações mais humanizadas do país.

 

 

*Clarissa Medeiros é CEO da Clarity Global

 

 

Foto: Daniela Toviansky