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06/08/2025 - 10h29

O futuro da liderança é a consciência

Clarissa Medeiros aponta o que um líder precisa assimilar para manter a sua relevância

 

 

Por Clarissa Medeiros*

 

 

Vivemos um momento único na história da gestão. Muito se fala sobre transformação digital, inteligência artificial e novos modelos de trabalho, mas há uma disrupção silenciosa — e talvez ainda mais desafiadora — acontecendo dentro das lideranças: a necessidade de atualizar não apenas ferramentas, mas o próprio modelo de consciência com o qual tomamos decisões, gerimos pessoas e conduzimos nossos negócios.

 

O que realmente está mudando?

Se há alguns anos falávamos em competências técnicas e habilidades comportamentais como alicerces da liderança eficaz, hoje a pauta vai além. Estamos entrando em uma nova era, onde a inteligência perceptiva, a capacidade de auto-observação e a presença consciente se tornam diferenciais reais.

 

Esse movimento, embora possa parecer sutil, é uma resposta forte ao colapso do antigo paradigma que esteve alicerçado no excesso de comando e controle, na lógica do esforço sem limites, na ideia de que sentir é fraqueza e que vulnerabilidade precisa ser escondida. Esses modelos mentais ainda estão enraizados em muitas culturas organizacionais, mas já não entregam os resultados esperados. Isso faz sentido pra você?

 

As novas travas da liderança

Em mais de 25 anos atuando com desenvolvimento humano e liderança, identifiquei dois grandes bloqueios que impedem líderes de acessarem todo o seu potencial:

 

► Falta de autoconfiança – mesmo lideranças bem-sucedidas carregam dúvidas sobre sua capacidade de sustentar o sucesso devido à dificuldade de lidar com um contexto de vida e carreira marcado por múltiplas disrrupções e incertezas, a elevada de pressão pela superação constante de metas e, muitas vezes, por histórias pessoais ou padrões familiares que impactam a autoestima.

 

A maioria das lideranças ainda fala pouco sobre o assunto ou pede ajuda profissional, o que gera uma escalada de ansiedade e solidão diante de decisões difíceis.

 

► Medo de mostrar sua potência – outras lideranças sabem do que são capazes, mas se retraem inconscientemente diante de demanda por mais visibilidade. Essa retração pode vir na forma de autossabotagem – quando o profissional evita tomar decisões ou fazer aquilo que colocará seu trabalho em mais evidência, e, na minha experiência corporativa, é especialmente comum entre as mulheres, por motivos culturais. Há também o excesso de racionalização das relações, tratando as pessoas de forma “transacional” – quando o acordo implícito é “você vale quanto entrega e nada mais”. Há hiperfoco em questões operacionais ou dificuldade em confiar e delegar, levando ao microgerenciamento e estresse do time.

 

Seja qual for o desafio que você mais se identifica hoje, vejo algo em comum entre esses dois perfis: a maioria dos profissionais ainda evita ou desconsidera uma fonte essencial de informação — a inteligência intuitiva, ou melhor, a sua capacidade de perceber, conectar e antecipar cenários a partir do sentir e da conexão emocional com as pessoas na organização.

 

Em ambientes corporativos muito racionais, essa habilidade é frequentemente subestimada e até ridicularizada, quando, na verdade, é uma forma de percepção sutil apurada, que traz uma vantagem adaptativa poderosa para lidar com complexidade, incerteza e mudança.

 

O que a ciência nos mostra

A nova ciência — que integra neurociência, psicologia transpessoal e física de sistemas complexos — já comprova que o ser humano tem capacidades perceptivas muito amplas. Intuição, empatia profunda e estados de presença são não só reais como mensuráveis. Ignorar essas competências é, hoje, um erro estratégico.

 

Mais de 90% das pessoas possuem habilidades perceptivas latentes, mas foram ensinadas a não confiar nelas. Isso gera líderes desconectados de si mesmos, excessivamente reativos, esgotados emocionalmente e cada vez mais distantes de suas equipes.

 

Um convite à liderança consciente

Estamos diante de uma transição com múltiplas dimensões simultâneas que vai exigir saltos de consciência, não apenas atualizações técnicas. E esse salto não é linear. Ele acontece quando um líder aceita que é preciso se transformar para continuar relevante — e que não dá mais para liderar apenas com a mente lógica. Será necessário integrar razão e sensibilidade, análise e intuição, presença e propósito.

 

Se você sente que há algo mais que precisa emergir na sua forma de liderar — algo que não está nos manuais de gestão, mas que pulsa como um chamado interno — saiba que essa sensação é compartilhada por milhares de líderes no Brasil e no mundo.

 

A próxima década será marcada por lideranças que escolhem protagonizar a construção de novos paradigmas, e isso é a essência de uma liderança consciente, disruptiva e regenerativa. E esse protagonismo, que leva às novas formas de ver, decidir e agir, começa pela reconexão com aquilo que é essencial: sua própria consciência e a conexão emocional consigo e com os outros.

 

 

*Clarissa Medeiros é mentora de lideranças, palestrante, sócia-fundadora da Clarity Global e colunista do portal Gestão RH

 

 

 

Foto: Daniela Toviansky