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12/06/2025 - 15h29

Afastamentos por saúde mental: solução ou armadilha para trabalhadores e empresas?

Saiba o que diz a psiquiatra Camila Magalhães Silveira e confira suas as orientações

 

Por Camila Magalhães Silveira*

 

 

Os afastamentos por transtornos mentais cresceram expressivamente nos últimos anos. Em 2023, o INSS concedeu 288.865 benefícios devido a esses problemas, um aumento de 38% em relação ao ano anterior. Em 2024, esse número já ultrapassou 440 mil afastamentos, o maior registrado na história do país. Comparado a 2014, quando houve 203 mil casos, o crescimento foi superior a 100% em uma década.

 

Os transtornos mais comuns incluem episódios depressivos (113.604 casos em 2024) e transtornos de ansiedade (141.414 casos), reforçando a urgência de ações voltadas à saúde mental no ambiente corporativo.

 

Afastamentos prolongados trazem desafios tanto para os trabalhadores quanto para as empresas. Para os funcionários, o retorno ao trabalho sem planejamento adequado pode gerar insegurança, agravar sintomas e resultar em novas licenças. O isolamento e a falta de suporte dificultam a recuperação e aumentam o risco de cronificação dos sintomas.

 

Já para as empresas, os prejuízos vão além dos custos diretos com substituições e afastamentos recorrentes. A produtividade cai, o clima organizacional se deteriora e as equipes sobrecarregadas se tornam mais vulneráveis ao adoecimento. A dificuldade de reintegrar funcionários afastados e a falta de preparo das lideranças para lidar com essas questões agravam o cenário, perpetuando um ciclo difícil de interromper.

 

Diante desse contexto, a gestão da saúde mental deve ir além da concessão de afastamentos. Empresas que investem em um ambiente de trabalho mais saudável reduzem significativamente as licenças médicas. Além disso, a nova Norma Regulamentadora (NR-1), que estabelece diretrizes para a gestão de riscos ocupacionais, reforça a necessidade de medidas preventivas e a adaptação das condições de trabalho para minimizar impactos à saúde mental dos colaboradores. Algumas iniciativas fundamentais incluem:

 

► Políticas de prevenção: avaliações periódicas e programas de bem-estar para identificar sinais precoces de esgotamento e transtornos emocionais. As avaliações periódicas da saúde mental, seja a cada seis meses ou anualmente, permitem um direcionamento preciso sobre a gravidade dos casos e a necessidade de ajustes nas condições de trabalho.

 

 Diálogo aberto e acompanhamento contínuo: consultas regulares com médicos e psicólogos, além de uma cultura organizacional que incentive a transparência sobre saúde mental, são essenciais. O RH pode atuar como mediador entre colaboradores e profissionais de saúde, garantindo que as recomendações médicas sejam seguidas. Esse acompanhamento deve considerar práticas de retomada gradual e metas individuais, alinhadas com a equipe de liderança para assegurar um retorno sustentável.

 

► Retorno planejado: protocolos estruturados para reintegração gradual, ajustes na carga de trabalho e suporte psicológico contínuo. Cada processo deve ser personalizado, levando em conta as necessidades específicas do colaborador para evitar recaídas e facilitar a adaptação. A identificação de fatores relacionados ao ambiente corporativo que possam ter contribuído para o afastamento são fundamentais para uma recuperação eficaz.

 

► Capacitação da liderança: gestores preparados para lidar com questões emocionais reduzem conflitos e fatores de estresse no ambiente corporativo. Por isso, treinamentos são indispensáveis para que identifiquem sinais de adoecimento mental e ajam preventivamente. Além disso, um feedback estruturado e empático contribui para um ambiente seguro e favorece a recuperação dos colaboradores.

 

► Ajustes Organizacionais: avaliar e corrigir fatores estruturais que impactam a saúde mental, como carga excessiva de trabalho, prazos irreais, falta de suporte e ambientes hostis, é essencial para reduzir afastamentos. Melhorias nesses aspectos promovem um ambiente equilibrado e produtivo.

 

Mais do que uma exigência legal, é importante compreender a saúde mental como um fator estratégico, e não apenas um problema a ser remediado. Além de reduzir afastamentos, um ambiente organizacional saudável melhora o engajamento, a produtividade e a retenção de talentos. Criar uma cultura de cuidado com a saúde mental deixou de ser um diferencial — tornou-se uma necessidade para a sustentabilidade dos negócios. E sua empresa, como está se posicionando nesse sentido?

 

 

*Camila Magalhães Silveira é psiquiatra e cofundadora da Caliandra Saúde Mental

 

 

 

Foto: Nilani Goettems