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19/02/2024 - 11h10

Agenda DE&I e o saudável caminho do meio

Antes, durante e depois do Carnaval, o tema não sai da pauta, diz Marcelo Madarász em sua coluna

 

 

Por Marcelo Madarász*

 

 

Escrevo este artigo no último dia do Carnaval e trago essa informação para contextualizar alguns elementos que se revelam importantes em nosso cenário. Como disse o rabino Nilton Bonder, “o mundo atravessa uma fase de profundo antagonismo, provocado por posições extremistas e radicais que não toleram a diversidade de opinião, buscando antes o conflito que a compreensão e o entendimento. Esse tipo de postura se torna particularmente perigoso quando conduz ao sectarismo político ou fundamentalismo religioso” e temos visto isso acontecer em muitas esferas.

 

No passado, era comum ouvirmos que, no Brasil, tudo começava mesmo depois do Carnaval; isso ficou no passado, pois muita coisa já aconteceu antes e muitas coisas, algumas até assustadoras, aconteceram durante a “festa da carne”. Tentemos deixar julgamentos de lado, mas é curioso o comportamento de boa parte da população, que aparentemente se aliena e entra no clima do Carnaval, deixando um pouco a realidade à parte.

 

Sem perder o foco, gostaria de chamar atenção para a importância de um movimento oposto ao da alienação, que, sem exageros, talvez seja o único caminho para não se deixar enganar por guerras de narrativas, estar consciente e atento ao que está acontecendo ao nosso redor e às tentativas de imposição de determinadas narrativas que têm a intenção de capturar a nossa opinião, para um lado ou para outro. O antídoto para não nos deixarmos levar é justamente a presença, o conhecimento e a consciência da realidade de forma mais ampliada e aprofundada.

 

Assistimos (ou não) aos acontecimentos do Carnaval e percebemos que nesse período estão sujeitos à mesma agenda do resto do ano. E, por falar em agenda, após a Quarta-Feira de Cinzas, voltamos às nossas agendas. No mundo organizacional, uma delas é o tema Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I), que, de certa forma, está sujeito aos mesmos movimentos vistos durante o Carnaval: polaridades, beligerância, conflitos. Apocalipse e arrebatamento versus macetar o apocalipse, escolas de samba polemizando determinadas funções, flerte entre o legal e o ilegal, fronteiras do que é moral e do que não é, sequestros de temas por questões ideológicas e por aí vai…  O ser humano é complexo e parece que nosso mundo tem ficado cada vez mais desafiador.

 

Voltando ao tema da DE&I, trabalho para uma empresa americana, que completará 107 anos em março. Como muitas outras, está às voltas com estratégias de inclusão da diversidade e, pela primeira vez desde sua fundação, temos uma CEO mulher, dois presidentes de grupos globais negros e uma mulher negra que é vice-presidente global de DE&I. Elementos deveras saudáveis que revelam coerência entre o discurso e a prática de valorizar a diversidade e ter a intenção de trazê-la de forma inclusiva para suas operações em todas as regiões do mundo nas quais atua.

 

O CEO anterior tinha uma frase muito conhecida na organização: O que você tolera, você promove. Isso deixava (e continua deixando) muito claro que atitudes e ações de nossos líderes e colaboradores inadequadas, desrespeitosas e preconceituosas não são toleradas. Essa mesma intolerância foi o que fez, há algum tempo, com que uma famosa empresa global de TI tenha decidido por três demissões. Isso porque, em sua filial brasileira, resolveram fazer um baile à fantasia como celebração de final de ano. Um colaborador foi fantasiado de um homem negro sexualizado, o famoso Negão do WhatsApp. Uma foto dele chegou à matriz, que resolveu desligar o colaborador. O gerente da área achou um exagero e se posicionou. O presidente da filial brasileira defendeu os dois, dizendo que era apenas uma brincadeira. Resultado: os três foram demitidos.

 

É claro que os líderes precisam zelar pelo que fazem e pelo que falam, dado que são referências para todos. Da mesma maneira, pessoas públicas, muitas vezes em posições de poder, precisam cuidar do que falam, ao expressarem preconceitos em relação à etnia ou determinadas visões preconceituosas de determinadas profissões. Idem para os artistas.

 

Nessa guerra ideológica, Ana Maria Diniz, fundadora do Instituto Península, voltado à formação de professores, empresária e conselheira do Todos pela Educação e Parceiros pela Educação, escreveu recentemente um artigo chamado A Tirania DEI, no qual revela com brilhantismo que mundialmente houve a institucionalização das pautas que se tornaram a causa da esquerda, com um entendimento muito peculiar sobre o que é racismo, justiça social e democracia, como resultado um ensino superior dominado pela ideologia e não pela razão. É como se os acadêmicos defendessem um único ponto de vista e não tolerassem uma opinião diferente.

 

Nós que queremos contribuir e construir um mundo melhor precisamos ficar muito atentos para não cairmos em armadilhas ideológicas que, a pretexto de trazer DE&I, estão muitas vezes fomentando mais intolerância, exclusão e ódio. Lutemos pela diferença que queremos trazer para o mundo – para melhor!

 

*Marcelo Madarász é diretor de RH para América Latina da Parker Hannifin

 

 

Foto: Marcos Suguio