16/08/2023 - 15h45
O CEO em transformação: foco na confiança e colaboração com os stakeholders
A saúde das empresas depende de uma estratégia da conversação das lideranças, diz CEO da Delfia
Por Rodrigo Bocchi*
Em tempos de incerteza, ou o CEO conquista a confiança de seus stakeholders – colaboradores, clientes, fornecedores e investidores – ou sua missão será abortada. Na economia digital de um mundo pós-pandemia, mudanças acontecem em milissegundos, derrubando gigantes e colocando em destaque novas empresas. Neste contexto, há uma crise de confiança que corrói processos e promove a desconexão entre os times. Isso é o que atesta a pesquisa "Barômetro da Confiança", estudo realizado pela Edelman em 2021 a partir de entrevistas com 33.000 profissionais de 28 países, incluindo o Brasil. A pesquisa mostra que se confia mais em quem está perto e tem compromisso com a pessoa – no mundo todo, 76% disseram que confiam em seu gestor imediato. No Brasil, essa marca chega a 79%.
O outro lado da moeda é que 48% não confiam nos seus CEOs, seguidos por 41% que não acreditam na palavra de representantes do governo.
CRISE DE CREDIBILIDADE
A crise de confiança é, na verdade, uma crise de credibilidade. O mesmo estudo revela que12% acreditam imediatamente na fala de seu CEO – outros 49% acreditam só de vez em quando nessas informações. Parece que o que se fala influi no índice de confiabilidade do empregador; 86% precisam escutar a visão de seu líder a respeito da automação da força de trabalho, contexto econômico e sobre questões que dizem respeito à vida dos colaboradores da empresa.
Um estudo realizado pela Korn Ferry em outubro de 2020 a partir de entrevistas com 105 CEOs de empresas dos Estados Unidos mostra que "a voz do dono" é, hoje, uma voz que tem a missão de falar a verdade para diferentes públicos, em diferentes linguagens. Mas, mais do que falar, o "dono" é chamado a ouvir o que seus diferentes stakeholders têm a dizer. Para 30% dos CEOs entrevistados, essa comunicação de mão dupla é desafiadora; 14% do universo pesquisado afirmou, ainda, se sentir pressionado a ganhar skills para realizar essa comunicação da melhor forma possível.
Segundo um estudo de 2016 da consultoria global CEB, é durante período de transições que se agudiza a sensação de incerteza dos stakeholders envolvidos numa organização. O documento mostra que 80% dos líderes da empresa passando, por exemplo, por um processo de M&A, têm a tentação de gerenciar essa mudança de cima para baixo. O resultado dessa abordagem, segundo a CEB, é o pior possível: 64% dos colaboradores de empresas que passaram por um processo de M&A seguindo esse modelo disseram sentir menos confiança em seus líderes; 28% foram além e afirmaram resistir à mudança organizacional. Por outro lado, o mesmo estudo revela que a comunicação inclusiva sobre mudanças organizacionais intensifica, entre 59% dos entrevistados, o orgulho que sentem pela empresa onde trabalham. Outros 35% disseram que esta prática lhes traz esperança.
ESTRATÉGIA DE CONVERSAÇÃO
Fica claro que a saúde da empresa depende do CEO e de outros líderes contarem com uma estratégia de conversação. É fundamental envolver os diversos públicos em um diálogo constante.
Muitos consideram a comunicação ou a conversação entre o CEO e seus diversos interlocutores algo oral. Isso é um engano. A expressão facial ou corporal do CEO é lida, analisada, comentada. Pode acontecer do CEO, assistindo uma apresentação de um colaborador, demonstrar uma sensação de incômodo. Seu rosto pode estar se contorcendo por uma dor nas costas – não importa a razão. O que o CEO expressa impacta seu entorno.
Essa não é a única armadilha da jornada de conversação entre o CEO e seu time. Há aspectos que podem facilitar esta troca:
Dominar a mensagem, o fato que independe do público.
Customizar a mensagem para cada um dos públicos, procurando criar uma base comum de informação antes de avançar para conceitos mais complexos.
Compreender que ouvir seu interlocutor é tão rico e essencial quanto disseminar uma mensagem.
Usar de empatia para ir ao encontro do seu interlocutor, sem adotar uma posição defensiva.
A VERDADE
Na jornada de conversação do CEO com todos os stakeholders, é importante que o assunto conversado com o colaborador esteja alinhado com os tópicos abordados, por exemplo, com o board. Não há assuntos a serem escondidos. A força de cada organização depende de todos trabalharem com o mesmo fato: a verdade.
É aí que nasce a confiança. Vale a pena compartilhar sucessos e fracassos e escutar narrativas de sucessos e fracassos. Trata-se de um "pitch" transparente que tenta fazer da organização um corpo coeso, com foco e com velocidade compartilhada por todos os times.
Se toda a vida do CEO é uma vida de muita responsabilidade, há, também, muitas alegrias. Uma delas é ver o colaborador avançar em sua carreira, em sua prosperidade. Se a empresa conta com profissionais que foram promovidos ou encontraram posições vantajosas tanto em casa como no ecossistema ao redor da organização (fornecedores e clientes), isso é um sinal da saúde desta cultura corporativa.
A ERA DO CHIEF COLLABORATION OFFICER (CCO)
Esse compromisso com o crescimento do profissional é uma pedra de toque para a construção de um ambiente transparente. A confiança é uma matriz múltipla, que conecta pessoas diferentes, realizando funções diferentes. Isso é colaboração. Um estudo da universidade Stanford publicado em 2015 no livro 7 Steps To Success For Sales Managers, de Max Cates, revela que pessoas trabalhando em grupo persistem na resolução de um desafio 64% a mais de tempo do que quem atua isolado. A criatividade e a inovação avançam numa organização colaborativa.
Em meio a tantas mudanças, o papel do CEO inclui ganhar skills de um novo perfil: o CCO (Chief Collaboration Officer).
Um estudo da SpencerStuart realizado em 2020 com 20 CEOs das marcas de consumo de luxo globais – não por acaso, empresas em que o serviço tem de ser impecável, gerando experiências prazerosas para o cliente – aponta as razões para essa evolução. Acabou a era da liderança com o perfil Comando e Controle. O mundo é complexo demais, diversificado demais e se move rápido demais. Vencerá o CEO que construir laços de confiança e de verdade com seu time, com o cliente, com o fornecedor e com o investidor.
*Rodrigo Bocchi é CEO da Delfia, empresa de curadoria de jornadas digitais
Foto: Divulgação