27/07/2021 - 17h34
Nem todo mundo quer ser chefe
Ser reconhecido não significa necessariamente uma promoção a líder, diz Beatriz Machado neste artigo
Por Beatriz Machado*
O trabalho dignifica o homem. Foi o que disse Barão de Mauá, em uma frase replicada até hoje incessantemente. Mas ele faz muito mais do que isso. Ele permite que as pessoas vivam, sobrevivam, realizem sonhos… Quer motivação maior para trabalharmos muito, o tempo todo? Quanto mais trabalharmos, mais conquistas teremos? Maiores seremos? Melhores?
O trabalho me possibilitou viajar para fora. Nasci de pais sem o ensino superior. Estudei em colégio público por um período para que o meu pai pudesse fazer uma faculdade. E, quem diria, essa pessoa típica da classe média brasileira estava no estrangeiro, realizando sonhos, graças ao trabalho. Crescer, crescer, crescer. Para isso? Trabalhar, trabalhar, trabalhar.
Quando fui promovida a coordenadora em uma grande empresa veio meu primeiro questionamento sobre o assunto. Entrei em pânico. Era a realização de um objetivo. Mas então viria mais trabalho para realizar o próximo? E tinha tempo para isso? Saúde para isso? Mas se não crescesse mais, era o fim? A estagnação? Quem conversaria comigo? Afinal, livros ensinam a ser gestores. Os artigos são assinados por líderes. As palestras costumam ser de motivação. É preciso ser mais. Por quê?
Existe uma pressão coletiva, uma premissa quase que absoluta, de que todos devem querer ser chefes. É como se ser apenas um colaborador, um subordinado, não seja digno de mérito. Mas não são justamente os subordinados que costumam fazer a máquina funcionar? Algum negócio já se sustentou apenas com chefes? Então porque eles recebem toda a glória?
Muitos dirão que a pandemia mudou o formato de trabalho e o mindset das pessoas. Mas essa disrupção já vinha sendo construída, ela só foi acelerada. Isso porque as pessoas estão começando a ser mais sinceras consigo mesmas. Pensando na tão falada saúde mental, que tem muito a ver com aceitarmos quem somos. E se eu não quiser ser chefe a qualquer custo? E se eu não tiver o perfil para isso? Devo me enquadrar apenas porque, na teoria, teria que ser meu desejo?
Está na hora de conversar com os subordinados. Está na hora de parar de querer torná-los chefes para que recebam seu devido valor. Eles podem tê-lo no lugar onde se encontram hoje, fazendo o que fazem agora. Eles não são maiores e nem menores na empresa pelo cargo que ocupam. Se estão ali, é porque o trabalho precisa deles. Então talvez tenha chegado o momento de permitir e estimular que todo profissional seja autoconfiante. E considerarmos que, pensando que nem todos podem necessariamente querer ser chefes, vale olhar para os demais além deles.
*Beatriz Machado é coordenadora sênior de Marketing de multinacional e autora do livro O Subordinado
Foto de abertura: Sofia Colucci