Imagem da matéria O que tênis e pickleball revelam sobre liderança e cultura corporativa
Revista Gestão RH - Edição 169
14/10/2025 - 10h00
Artigos

O que tênis e pickleball revelam sobre liderança e cultura corporativa


Por Lísia Prado
Em tempos de transformação cultural nas empresas, poucos temas têm revelado tanto sobre saúde emocional e liderança quanto o esporte. Em uma das conversas mais instigantes do SXSW 2025, a pesquisadora Brené Brown e o ex-tenista Andy Roddick exploraram o que o tênis e o pickleball podem nos ensinar sobre performance, pertencimento e propósito. E não se trata apenas de esporte, mas de uma metáfora poderosa sobre relações humanas, gestão de times e construção de ambientes saudáveis.
 
A crescente popularidade do pickleball, especialmente nos Estados Unidos, não é à toa. Trata-se de uma modalidade que combina movimento, estratégia e conexão humana – características cada vez mais desejadas também nas organizações. Mais inclusivo e de rápida aprendizagem, o pickleball reúne, em quadra, desde executivos de alto nível até iniciantes com histórico de sedentarismo. O ponto de virada? Sua acessibilidade emocional e física, que gera pertencimento imediato e reduz a comparação paralisante.
 
Processos, não apenas resultados
Na conversa em Austin, Brené enfatizou um ponto essencial: em vez de jogar apenas para vencer, pickleball convida os jogadores a jogarem para aprender. Isso ecoa com força nas empresas. Segundo o relatório global da McKinsey (2023), organizações que valorizam o processo e a aprendizagem contínua em seus times são 29% mais resilientes diante de adversidades e têm rotatividade até 50% menor.
 
Tanto no tênis quanto no ambiente de trabalho, a diferença entre “jogar para ganhar” e “jogar para não perder” muda completamente a postura. No primeiro caso, há presença, risco, autenticidade. No segundo, há rigidez, defesa e retração. Esse contraste é especialmente visível em times que operam sob pressão sem segurança psicológica – e pode ser revertido com práticas intencionais de desenvolvimento emocional, como feedback estruturado, escuta ativa e a normalização do erro como aprendizado.
 
Treinar acima do seu nível: o estado de flow social
Brown também citou o fenômeno de “treinar acima da própria média” – aquele momento em que, em parceria, uma dupla de jogadores joga melhor do que jogaria sozinha. Ela chama isso de estado de elevação compartilhada. Em psicologia positiva, é o que Mihaly Csikszentmihalyi chamou de flow: foco intenso, prazer e desempenho alinhados.
 
Um estudo da Gallup (2022) indica que funcionários que vivenciam esse tipo de experiência em grupo têm duas vezes mais chances de permanecer na empresa por mais de três anos e 48% mais engajamento no dia a dia.
 
Outras pesquisas recentes em neurociência social indicam que o flow coletivo aumenta a produção de oxitocina, o que potencializa a confiança e reduz a percepção de ameaça entre colegas – tornando equipes mais colaborativas e eficazes (Rock & Ringleb, 2022).
 
Trazido para a prática, isso pode significar líderes que compartilham vulnerabilidades, metas e aprendizados, em vez de apenas delegar e cobrar. A coragem de errar junto fortalece a coragem de crescer junto.
 
Adversidade como alicerce da cultura
Outro ponto forte da conversa entre Brown e Roddick foi o papel da adversidade. Brown lembra que normalizar o desconforto é vital – tanto na quadra quanto na liderança. Esconder falhas ou buscar uma zona permanente de conforto prejudica a confiança e esvazia o sentido de pertencimento.
 
O relatório da Deloitte (2024) mostrou que empresas que incentivam a exposição segura ao erro e ao feed- 
back têm 37% mais inovação incremental e 24% mais confiança interna em processos decisórios.
 
Estes dados sustentam uma verdade desconfortável, porém necessária: não há crescimento emocional sem incômodo. E a cultura da confiança nasce exatamente da permissão para enfrentar, juntos, o que ainda não está resolvido.
 
Esportes como o pickleball, que envolvem constante adaptação, erros rápidos e correções em tempo real, são metáforas vivas do que significa liderar com coragem, vulnerabilidade e constância emocional.
 
Uma oportunidade para líderes
Ao promover atividades físicas como parte da rotina, especialmente aquelas que envolvem jogo, estratégia, leveza e socialização, líderes têm a chance de transformar o clima das suas equipes. A prática pode começar pequena, com encontros semanais, torneios internos ou convites abertos à experimentação.
 
É também uma maneira de mostrar coerência: quando a liderança se engaja, os times percebem que o discurso de cuidado não é apenas retórico, mas vivido. Mais do que endomar-
keting, essas iniciativas alimentam a cultura de pertencimento por meio da vivência, onde o esporte vira símbolo de uma empresa que se move com e para as pessoas. E poucas coisas conectam tanto quanto estar ao lado do time, na quadra, dividindo aprendizados, derrotas e vitórias.
 
Talvez o sucesso crescente de esportes como o pickleball esteja nos lembrando disso: que o trabalho pode (e deve) ser um lugar onde corpo, mente e relações importam.
 
Lísia Prado é sócia e consultora da House of Feelings, primeira escola de sentimentos do mundo

Últimas matérias

Imagem da matéria Deel apresenta as nove tendências de trabalho para 2026
Deel apresenta as nove tendências de trabalho para 2026
Radar - 2025 - Edição
A volta da busca por estabilidade no emprego é uma delas, de acordo com dados da companhia
Ver MAIS
Imagem da matéria Por que reduzir a jornada de trabalho pode ser o maior investimento em produtividade das empresas
Por que reduzir a jornada de trabalho pode ser o maior investimento em produtividade das empresas
Artigos - 2025 - Edição
Para o CEO da Embalixo, essa medida não significa abrir mão de metas e sim dar foco ao que realmente importa
Ver MAIS
Imagem da matéria Três atitudes para as empresas evitarem a espiral do desespero do final do ano
Três atitudes para as empresas evitarem a espiral do desespero do final do ano
Saúde e Bem-Estar - 2025 - Edição
Saiba como é possível cumprir as metas estabelecidas, evitar a sobrecarga e manter a produtividade das equipes
Ver MAIS
Imagem da matéria Com governança, IA vai além do operacional e transforma o RH com vantagem estratégica
Com governança, IA vai além do operacional e transforma o RH com vantagem estratégica
Práticas Empresariais - 2025 - Edição
Diretora de Recursos Humanos da SantoDigital conta como está otimizando processos e evitando os riscos da Shadow AI
Ver MAIS

Matérias mais lidas

Imagem da matéria Cinco razões pelas quais colaboradores autistas podem ter dificuldade para falar temporariamente
Cinco razões pelas quais colaboradores autistas podem ter dificuldade para falar temporariamente
Artigos - 2024 - Edição 164
O especialista Marcelo Vitoriano fala de mutismo situacional, que pode afetar profissionais com autismo
Ver MAIS
Imagem da matéria Steck aposta em transformação digital e inovação na gestão de pessoas
Steck aposta em transformação digital e inovação na gestão de pessoas
Artigos - 2024 - Edição 166
Empresa investe em programas estratégicos para fortalecer cultura organizacional e liderança em seu setor
Ver MAIS
Imagem da matéria Learning Awards 2024: celebrando a excelência em educação corporativa
Learning Awards 2024: celebrando a excelência em educação corporativa
Artigos - 2024 - Edição 166
Edusense premiou os melhores cases de empresas em quatro categorias
Ver MAIS
Imagem da matéria Relações humanizadas x Relações transacionais - Uma reflexão necessária para lideranças e RHs
Relações humanizadas x Relações transacionais - Uma reflexão necessária para lideranças e RHs
Capa - 2024 - Edição 163
Clarissa Medeiros assinala: a forma que uma empresa age em determinadas situações pode definir a sua reputação
Ver MAIS
 Teste GRÁTIS por 7 dias