Por Thaís Gebrin
Ex-comissário de bordo, Gustavo Fermino, hoje líder de Recursos Humanos da MetLife – posto assumido recentemente –, conta como ter trabalhado na aviação o ajudou a ser o RH que é hoje. Ele também comenta como pretende fazer a diferença na companhia
De comissário de bordo a diretor de RH, Gustavo Fermino construiu uma carreira marcada por experiências transformadoras. Foram quase oito anos nos ares, convivendo com culturas diferentes e aprendendo, na prática, o valor da escuta, da empatia e da atenção aos detalhes — lições que hoje se refletem no seu jeito de liderar pessoas e negócios. Depois de vivências intensas em setores como aviação e agronegócio, ele chega à MetLife levando uma bagagem de quem já esteve perto da operação, das equipes e dos clientes, e que acredita no RH como protagonista da transformação organizacional.
À frente da área de Recursos Humanos da MetLife há poucos meses, Gustavo encara o desafio de fortalecer a cultura organizacional, apoiar as lideranças e estruturar práticas que garantam engajamento e retenção de talentos. Nesta entrevista, ele compartilha sua visão sobre os rumos do RH, a importância dos benefícios como diferencial competitivo, os aprendizados das fusões e aquisições pelas quais passou e até os prazeres fora do escritório.
Gestão RH – Sua chegada à MetLife se deu em junho, depois de atuar por anos no RH da Syngenta, que é do agronegócio. Como está se dando essa transição? Há muitas diferenças?
Gustavo Fermino – A transição tem sido muito positiva. Embora os setores sejam diferentes, os desafios com pessoas são bastante semelhantes: desenvolver lideranças, aproximar cada vez mais o RH do negócio e reforçar o desenvolvimento de carreira dos colaboradores. O que muda é o contexto em que tudo isso acontece. Na MetLife, um ponto muito interessante tem sido a agenda de transformação cultural, já que o Brasil vive um momento bastante estratégico dentro da companhia globalmente. Isso torna a experiência ainda mais desafiadora e ao mesmo tempo muito estimulante.
Gestão RH – Qual é a sua prioridade neste primeiro momento?
Gustavo Fermino – Quero reforçar a participação do RH como um parceiro estratégico do negócio, cuidando das pessoas, estando presente, com uma agenda potente e, ao mesmo tempo, com simplicidade. Minhas prioridades são fortalecer a cultura organizacional, apoiar a liderança e estruturar práticas que garantam engajamento e retenção de talentos.
Gestão RH – O que você considera ter levado de mais importante na bagagem nessa transição?
Gustavo Fermino – O mais importante é a experiência de ter vivido intensamente o negócio na prática. Estive sempre presente na operação, o que me deu clareza sobre como o RH pode ser mais consultivo, próximo das lideranças e com impacto real. Vivenciei essas experiências na indústria da aviação e depois no agronegócio. Trabalhei a bordo de aeronaves, estive no campo com clientes no mercado agro acompanhando as lavouras e isso é algo que trago comigo para a MetLife.
Gestão RH – A área de benefícios é bastante competitiva, como isso se reflete na gestão e retenção de pessoas?
Gustavo Fermino – A competitividade da área de benefícios é um tema central para qualquer empresa que queira atrair e reter talentos. A MetLife realiza anualmente uma pesquisa com mais de mil profissionais e 250 tomadores de decisão para entender as tendências dos benefícios para os empregados, a EBTS [Employee Benefits Trends Study, estudo com empregadores e funcionários sobre expectativas em benefícios e cuidado no trabalho]. Veja o que essa pesquisa trouxe esse ano: no Brasil, 82% dos funcionários afirmam que os benefícios oferecidos pela empresa são fator decisivo para permanecerem ou não no emprego. Além disso, mais de 70% destacam que benefícios personalizados, que considerem diferentes fases de vida e necessidades, aumentam o engajamento e a produtividade. Benefícios voltados à saúde mental e qualidade de vida são extremamente valorizados.
Na prática, isso significa que benefícios deixaram de ser apenas uma obrigação legal ou um pacote padrão para ser um diferencial estratégico. As pessoas buscam empresas que cuidam delas de forma integral, e isso impacta diretamente na percepção de valor, na motivação e na retenção. Para nós, líderes de Recursos Humanos, o desafio é equilibrar custos e competitividade, mas principalmente criar programas que façam sentido para diferentes perfis e que reflitam a cultura que queremos fortalecer na companhia.
Gestão RH – No início da carreira, antes de ingressar em RH, você foi comissário de bordo da Latam Airlines. Dá para contar um pouco sobre essa experiência e como se deu a migração para o RH na própria companhia aérea?
Gustavo Fermino – Ser comissário de bordo foi uma experiência incrível. Viajei o mundo, conheci culturas diferentes e aprendi a lidar com pessoas e situações muito diversas. Foram quase oito anos a bordo de aeronaves, representando a companhia e o nosso país em distintos destinos. Essa vivência me ensinou a importância da atenção aos detalhes, empatia e comunicação assertiva. Eu costumo dizer que para passar mais de 12 horas por dia (ou por noite) em uma aeronave fechada com mais de 200 pessoas precisa gostar muito de gente! Já vivenciei histórias hilárias, casos críticos de saúde, algumas pequenas emergências… tudo isso me ajudou a construir uma habilidade de lidar com pessoas diferentes em ambientes sob pressão.
Sem contar o tema de diversidade. Equipes diversas, públicos de várias partes do mundo, foi uma escola incrível de diversidade! Precisamos de uma entrevista só para esse assunto (risos). Até hoje sou apaixonado pela aviação. Após quase oito anos de voo, recebi um convite para migrar para o RH, ainda dentro da Latam, com foco na gestão dos comissários e, depois, em treinamento das equipes de voo. Percebi que poderia unir esse aprendizado humano a uma atuação mais estratégica dentro da empresa. Foi assim que comecei a construir minha carreira na área de Recursos Humanos.
Gestão RH – Qual foi a sua primeira impressão quando chegou ao RH?
Gustavo Fermino – Minha primeira impressão quando cheguei à área de RH foi de surpresa com o impacto que a área de RH poderia gerar. Percebi que muitos RHs estavam distantes do negócio e das pessoas, e senti que queria fazer algo diferente: um RH com uma linguagem simples, que se conectasse de verdade com líderes e equipes. Antes de vivenciar na prática, eu não tinha clareza de quanto o RH pode influenciar diretamente na vida das pessoas e nos resultados da empresa.
Gestão RH – O que mais o atrai na área?
Gustavo Fermino – O que mais me atrai é a possibilidade de transformar. Transformamos pessoas, transformamos equipes, transformamos culturas. O RH tem o poder de criar ambientes mais diversos, humanos e colaborativos, impactando não só o negócio, como também a vida das pessoas. Tudo isso dentro de empresas, onde, sim, o foco são os resultados, o lucro. Estamos no universo capitalista e tudo bem. Agora, saber que dentro desse mundo o RH pode de fato atuar para transformar pessoas, ajudar a formar líderes melhores, criar oportunidades para jovens profissionais, ouvir as histórias das pessoas e ajudá-las a ocupar seus lugares de maior potencial… isso tudo é incrível e de uma grande responsabilidade.
Gestão RH – E o que menos o atrai?
Gustavo Fermino – O que menos me atrai é quando o RH é visto apenas como operacional. Acredito que nosso papel vai muito além disso – precisamos ser protagonistas na estratégia e na cultura das empresas. Mas a culpa é do próprio RH, que muitas vezes é distante, sem propriedade de como os negócios funcionam, ou que se colocam em um lugar "diferenciado" gerando distanciamento e falta de confiança das pessoas.
Gestão RH – No seu entendimento, o que é ser um líder de RH nestes tempos de volatilidade e rapidez em tudo o que acontece?
Gustavo Fermino – Significa ser flexível, ágil e capaz de se adaptar sem perder a clareza de propósito. É equilibrar análise de dados com proximidade humana, tomar decisões rápidas, mas sempre ouvindo as pessoas e construindo confiança. O mundo está mudando muito rápido. Trabalhar com pessoas não é uma ciência exata, e está tudo bem. Cada vez mais, precisamos estar confortáveis em lidar com zonas cinzentas, temas ambíguos, e não saber todas as respostas. Ajudar os times a lidarem com isso também é um papel das lideranças de Recursos Humanos.
Gestão RH – Recentemente, ainda na Syngenta, você vivenciou um processo de aquisição de outra empresa. Esse foi o seu maior desafio profissional?
Gustavo Fermino – Sim, foi um dos maiores desafios da minha carreira. Nos últimos quatro anos, participei de quatro aquisições, e cada uma tinha suas particularidades. O trabalho envolveu alinhar culturas diferentes, engajar líderes e equipes em momentos de muita incerteza e, ao mesmo tempo, manter a operação funcionando bem.
Em um processo de fusão ou aquisição, o maior risco é perder o engajamento das pessoas, perder talentos-chave e conhecimento. Isso acontece pois em um M&A o primeiro sentimento que vem para os colaboradores é o medo. Medo de perderem suas posições, medo da mudança, medo do desconhecido. O medo é algo totalmente humano, e precisamos ter clareza disso para ajudar as lideranças e as empresas.
Gestão RH – Qual foi o grande aprendizado nesses processos?
Gustavo Fermino – Foi um aprendizado enorme sobre como manter o ritmo sem perder a proximidade com as pessoas, garantir que a comunicação seja clara e constante, e que as ações sejam consistentes. Percebi também o quanto é importante estar sempre conectado ao negócio e aos objetivos estratégicos, porque só assim o RH consegue realmente fazer a diferença em processos tão complexos.
Gestão RH – Qual é a sua característica que mais ajuda no exercício da liderança? E para atuar em RH?
Gustavo Fermino – A minha principal característica é a escuta ativa. Sempre procuro ouvir antes de tomar decisões, entender diferentes perspectivas e captar o que realmente importa para cada pessoa ou situação. Isso ajuda a fortalecer a colaboração dentro das equipes e permite que as soluções sejam mais completas e efetivas.
No RH, essa habilidade é ainda mais importante, porque nosso papel é estar perto das pessoas e do negócio ao mesmo tempo. Ouvir líderes e equipes me permite entender necessidades, identificar oportunidades de desenvolvimento e construir confiança, garantindo que as iniciativas do RH façam sentido de verdade e tenham impacto real. Para mim, a escuta ativa é o ponto de partida para gerar confiança. RH sem confiança não consegue entregar o que se propõe.
Gestão RH – Que legado você acredita deixar nas empresas em que trabalha?
Gustavo Fermino– Quero deixar um RH reconhecido como estratégico, mas também lembrado por cuidar das pessoas. Meu objetivo é transformar a forma como a área de Recursos Humanos é percebida: não apenas como suporte, mas como protagonista do negócio e da experiência das pessoas. É possível fazer uma gestão responsável, focada em resultados, mas que ao mesmo tempo seja leve, uma jornada divertida, e com respeito às pessoas e sua diversidade.
Gestão RH – E o que leva de maior valor?
Gustavo Fermino – Levo sempre os relacionamentos construídos. O que fica são as conexões humanas, o aprendizado conjunto e a sensação de ter contribuído para o crescimento das pessoas e da organização.
Gestão RH – Você vê jovens interessados em atuar em RH?
Gustavo Fermino – Na minha experiência, não vejo um interesse forte. Muitos ainda têm uma percepção limitada da área, enxergando apenas tarefas operacionais, folha de pagamento ou recrutamento. Poucos entendem que o RH pode ser estratégico, próximo do negócio e das pessoas, com impacto real na cultura e nos resultados da empresa. Acredito que é importante mostrar para eles o quanto a área é ampla e estratégica, para que mais jovens se sintam motivados a seguir carreira em RH.
Gestão RH – Que conselho deixa para quem pretende seguir carreira na área?
Gustavo Fermino – Meu conselho é: entenda o negócio, seja curioso e mantenha a escuta ativa. O RH precisa estar próximo das pessoas e da estratégia ao mesmo tempo. Essa combinação é o que garante relevância. Não se conforme com o modelo atual ou o que vocês conhecem ou escutam falar do RH. Precisamos de jovens talentos que provoquem, tragam ideias novas, que nos ajudem a transformar o RH.
Gestão RH – Qual é o futuro que imagina para o RH?
Gustavo Fermino – Um RH cada vez mais digital, orientado a dados e, ao mesmo tempo, mais humano. A tecnologia vai nos ajudar a ser mais eficientes, mas o que vai diferenciar as empresas será a capacidade de construir relações de confiança e cuidado genuíno. Isso a inteligência artificial não vai tirar da gente.
Gestão RH – O que você pensa quando olha para trás e vê onde está?
Gustavo Fermino – Quando olho para trás, vejo uma trajetória de muito aprendizado e experiências variadas que me trouxeram até aqui. Não comecei no RH; passei pela área comercial, call center e fui comissário de bordo, todas essas vivências me ensinaram algo valioso. Sinto orgulho de cada passo e honro essas experiências, porque elas moldaram minha forma de liderar e entender o negócio. Ao mesmo tempo, sinto uma grande responsabilidade na minha posição atual. Como todo líder de RH, preciso ter consciência de que as decisões que tomo impactam diretamente a vida das pessoas, suas famílias e até a sociedade ou comunidade onde a empresa está inserida. Isso é algo muito sério e que exige atenção, cuidado e consistência em todas as ações. Estar em uma posição de liderança significa continuar aprendendo e devolver esse aprendizado para as pessoas e para a organização, impactando positivamente líderes, equipes e resultados.
Gestão RH – Para finalizar, quem é o Gustavo quando sai da empresa, o que gosta de fazer?
Gustavo Fermino – Sou alguém que valoriza estar com as pessoas que ama — minha esposa, minha família, meus amigos. Momentos como almoços, churrascos, reuniões entre família e amigos são muito importantes para mim. Também cuido da minha saúde, acordando cedo para ir à academia antes do escritório, e tenho uma grande paixão por viagens, seja para destinos internacionais, seja para cidades próximas de São Paulo. Viajar é uma forma de viver intensamente e conhecer novas culturas. Sou também um apaixonado por aviação. Os aviões unem a engenharia e o sonho de voar, a razão e a emoção. Tudo o que envolve esse tema eu me conecto e gosto muito.









